Temos uma coluna mensal na revista Mundo Z, que é distribuída gratuitamente em algumas escolas de Ensino Médio de Belo Horizonte.
A coluna se chama #tamojunto.
Abaixo uma reprodução do texto publicado.
Para ler o original, clique aqui
Pergunta: Descobri que uma amiga minha está se cortando com uma lâmina…. Por quê ela faz isso? Como posso ajuda-la?
É comum fazermos marcas no corpo como forma de dizer do que estamos sentindo. Observe, por exemplo, que uma pessoa faz uma tatuagem para marcar uma determinada fase da vida, há mães que tatuam os nomes de seus filhos, pessoas que fazem tatuagens coletivas para simbolizar a amizade ou o vínculo vivido. A nossa pele, que é a nossa “fronteira” com o mundo externo muitas vezes é marcada para comunicar algo que estamos sentindo no mundo interno. Boa parte dessas marcas no corpo indicam um movimento vital, de pensar no futuro, celebrar o presente ou honrar o passado.
Entretanto, existem outras marcas no corpo que revelam dor e sofrimento. Os cortes, frequentemente, comunicam uma dificuldade em viver na própria pele. Estar na própria história, viver o próprio cotidiano, lidar com as dificuldades de crescer e, em alguns casos, lidar com dores do passado: tudo isso pode conduzir a um sofrimento que nem sempre consegue ser comunicado por palavras. Os cortes acabam se tornando um “ato mensageiro” para que essa dor que está no mundo interno passe, pela pele, nossa fronteira, para o mundo externo. Os relatos que escutamos dizem de uma sensação alívio com o corte, como se, ao sangrar ou ao doer, saísse o sofrimento que a pessoa está sentindo ao viver em sua própria pele. É um jeito um pouco paradoxal de buscar alívio, gerando uma dor no corpo para suportar a dor da alma.
Encontrar outras formas de “passar a dor para o mundo externo”, sem ser através dos cortes é o melhor caminho. Conversar, escrever, desenhar, contar histórias ou criar quadrinhos são formas de comunicar o que se passa no mundo interno e aprender a viver na própria pele, encontrando talentos, potências e possibilidades até então desconhecidas.
O melhor jeito de ajudar sua amiga é reconhecendo que há ali um sofrimento que precisa ser acolhido. Mais que julgar, ou dizer que aquilo é errado, é preciso escutar o que está tão difícil de suportar que está sendo preciso “sangrar” para que o sofrimento saia. É importante não guardar essa informação como um segredo e contar para algum adulto que possa ajudar: seja professora, mãe, pai, alguém da igreja, do clube, do bairro… alguém em quem você confie. Esse adulto deve informar a família de sua amiga para que ela possa ser ajudada também por profissionais da psicologia, que poderão apoiá-la na busca de outras formas de expressão da dor que não pelos cortes no corpo.
Quem quiser ler um artigo científico sobre o tema, recomendo:
Breton, D. L. (2010). Escarificações na adolescência: uma abordagem antropológica. In: Horizontes Antropológicos, Porto Alegre. Ano 16. N 33, p. 25-40